25 de novembro: dia de LUTO e de LUTA!

07:50 Postado por Thani

Segundo a Polícia, após uma discussão, o namorado agrediu Silvana com um pedaço de madeira, na cabeça.
A vítima caiu desacordada e o próprio namorado chamou a polícia. Ele fugiu em seguida, em um veículo Palio prata. Silvana foi encaminhada ao Pronto-Socorro de Cuiabá mas não resistiu aos ferimentos e morreu. O namorado está sendo procurado pelo homicídio."(http://www.cenariomt.com.br/noticia.asp?cod=150070&codDep=3)
O Comando Regional de Policiamento Ostensivo (CRPO) da Brigada Militar (BM) identificou, neste domingo, a jovem estrangulada na avenida Mallmann Filho, bairro Nova Santa Marta, em Santa Maria, na região Central do Estado. Mercedes da Costa Martins, de 20 anos, foi encontrada morta, por volta das 7h, em uma área verde.
Mercedes estava sem documentos. Ela tinha sinais de violência sexual, estava com as calças abaixadas e com as roupas rasgadas. A Delegacia da Mulher do município vai apurar o caso. (http://www.correiodopovo.com.br/Noticias/?Noticia=359754)


Essas são algumas notícias presentes diariamente nos jornais e na TV. Dados da Organização das Nações Unidas (ONU) indicam que mais de 70% das mulheres em todo o mundo sofrem algum tipo de violência de gênero ao longo da vida. A estimativa é que uma em cada cinco mulheres seja vítima de estupro ou de tentativa de estupro. Mulheres com idade entre 15 e 44 anos apresentam maior risco de sofrer violência sexual e doméstica do que de serem vítimas de câncer, acidentes de carro ou malária. 
25 de novembro é o Dia Internacional de Combate à Vilência contra as Mulheres. É um dia para manifestarmos nosso luto diante do feminicídio. É também, entretanto, um dia para denunciarmos essas agressões e fortalecermos nossa luta contra o machismo.
A violência contra as mulheres tem sua origem no sistema patriarcal. O fato de um homem agredir fisica ou verbalmente uma mulher, estuprá-la e até mesmo matá-la expressam uma noção que impõe uma necessidade de controle, apropriação e exploração do corpo, vida e sexualidade das mulheres. A desigualdade de gênero deve ser fortemente combatida em todos os âmbitos da sociedade. As medidas punitivas são necessárias, porém, não dão conta de combater a violência contra as mulheres. É necessário que haja transformações estruturais da sociedade. O capitalismo é essencialmente mantido pelas desigualdades e toda opressão, cada uma com suas peculiaridades, tem a função primordial de reproduzir e naturalizar as desigualdades sociais.
A universidade, por estar inserida na nossa sociedade e nela cumprir um papel, reproduz seus valores. Portanto, a luta contra o machismo é necessária também dentro da UFSM. Devemos denunciar e combater toda forma de diferenciação sexista, seja em sala de aula, PETs, grupos de pesquisa, etc, como em espaços de decisão, como conselhos, colegiados e movimento estudantil. Devemos defender a paridade de gênero e exigir medidas que coibam o preconceito contra as mulheres nesses espaços. Estudos de gênero são necessários e, para isso, é necessário que haja o direcionamento de recursos para a pesquisa e extensão em gênero. Acompanhamento psicológico às estudantes, professoras e funionárias que enfrentam a violência doméstica é necessário. Medidas de conscientização dos homens são necessárias. para combater a violência contra as mulheres, é necessário combater o machismo.
O combate à violência contra as mulheres é uma responsabilidade do Estado e nosso papel é cobrar do Estado as medidas necessárias para tal. É também responsabilidade de cada uma e cada um combater qualquer forma de opressão em nossas organizações e nosso cotidiano. Por isso, 25 de novembro é um dia para guardar luto por tantas mulheres vítimas do machismo e também uma dia para reafirmar a luta por uma sociedade livre de opressão e exploração.

"Diante de nós temos, não uma fêmea, nem uma sombra do homem, mas sim uma mulher-individualidade."
Alexandra Kollontai

Fontes:
http://www.sof.org.br/publica/MMM_Internacional_violencia.pdf
http://machismomata.wordpress.com/
http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2011-11-25/campanha-pelo-fim-da-violencia-contra-mulher-comeca-hoje-em-mais-de-160-paises

Publicado originalmente em http://dceufsm.blogspot.com

Che Guevara e os mortos que nunca morrem

14:14 Postado por Thani

Por Eric Nepomuceno

No dia em que executaram o Che Guevara em La Higuera, uma aldeola perdida nos confins da Bolívia, Julio Cortázar – que na época trabalhava como tradutor na Unesco – estava em Argel. Naquele tempo – 9 de outubro de 1967 – as notícias demoravam muito mais que hoje para andar pelo mundo, e mais ainda para ir de La Higuera a Argel.

Vinte dias depois, já de volta a Paris, onde vivia, Cortázar escreveu uma carta ao poeta cubano Roberto Fernández Retamar contando o que sentia: “Deixei os dias passarem como num pesadelo, comprando um jornal atrás do outro, sem querer me convencer, olhando essas fotos que todos nós olhamos, lendo as mesmas palavras e entrando, uma hora atrás da outra, no mais duro conformismo... A verdade é que escrever hoje, e diante disso, me parece a mais banal das artes, uma espécie de refúgio, de quase dissimulação, a substituição do insubstituível. O Che morreu, e não me resta mais do que o silêncio”.

Mas escreveu:

Yo tuve un hermano
que iba por los montes
mientras yo dormía.
Lo quise a mi modo,
le tomé su voz
libre como el agua,
caminé de a ratos
cerca de su sombra.
No nos vimos nunca
pero no importaba,
mi hermano despierto
mientras yo dormía,
mi hermano mostrándome
detrás de la noche
su estrella elegida.

A ansiedade de Cortázar, a angústia de saber que não havia outra saída a não ser aceitar a verdade, a neblina do pesadelo do qual ninguém conseguia despertar e sair, tudo isso se repetiu, naquele 9 de outubro de 1967, por gente espalhada pelo mundo afora – gente que, como ele, nunca havia conhecido o Che.

Passados exatos 44 anos da tarde em que o Che foi morto, o que me vem à memória são as palavras de Cortázar, o poema que recordo em sua voz grave e definitiva: “Eu tive um irmão, não nos encontramos nunca mas não importava, meu irmão desperto enquanto eu dormia, meu irmão me mostrando atrás da noite sua estrela escolhida”.

No dia anterior, 8 de outubro de 1967, um Ernesto Guevara magro, maltratado, isolado do mundo e da vida, com uma perna ferida por uma bala e carregando uma arma travada, se rendeu. Parecia um mendigo, um peregrino dos próprios sonhos, estava magro, a magreza estranha dos místicos e dos desamparados. Foi levado para um casebre onde funcionava a escola rural de La Higuera. No dia seguinte foi interrogado. Primeiro, por um tenente boliviano chamado Andrés Selich. Depois, por um coronel, também boliviano, chamado Joaquín Zenteno Anaya, e por um cubano chamado Félix Rodríguez, agente da CIA. Veio, então, a ordem final: o general René Barrientos, presidente da Bolívia, mandou liquidar o assunto.

O escolhido para executá-la foi um soldadinho chamado Mario Terán. A instrução final: não atirar no rosto. Só do pescoço para baixo. Primeiro o soldadinho acertou braços e pernas do Che. Depois, o peito. O último dos onze disparos foi dado à uma e dez da tarde daquela segunda-feira, 9 de outubro de 1967. Quatro meses e 16 dias antes, o Che havia cumprido 39 anos de idade. Sua última imagem: o corpo magro, estendido no tanque de lavar roupa de um casebre miserável de uma aldeola miserável de um país miserável da América Latina. Seu rosto definitivo, seus olhos abertos – olhando para um futuro que ele sonhou, mas não veria, olhando para cada um de nós. Seus olhos abertos para sempre.

Quarenta e quatro anos depois daquela segunda-feira, o homem novo sonhado por ele não aconteceu. Suas idéias teriam cabida no mundo de hoje? Como ele veria o que aconteceu e acontece? O que teria sido dele ao saber que se transformou numa espécie de ícone de sonhos românticos que perderam seu lugar? Haveria lugar para o Che Guevara nesse mundo que parece se esfarelar, mas ainda assim persiste, insiste em acreditar num futuro de justiça e harmonia? Um lugar para ele nesses tempos de avareza, cobiça, egoísmo?

Deveria haver. Deve haver. O Che virou um ícone banalizado, um rosto belo estampado em camisetas. Mas ele saberia, ele sabe, que foi muito mais do que isso. O que havia, o que há por trás desse rosto? Essa, a pergunta que prevalece.

O Che viveu uma vida breve. Passaram-se mais anos da sua morte do que os anos da vida que coube a ele viver. E a pergunta continua, persistente e teimosa como ele soube ser. Como seria o Che Guevara nesses nossos dias de espanto? Pois teria sabido mudar algumas idéias sem mudar um milímetro de seus princípios.

Diz Eduardo Galeano, que conheceu o Che Guevara: ele foi um homem que disse exatamente o que pensava, e que viveu exatamente o que dizia.

 


Assim seria ele hoje.


Já não há tantos homens talhados nessa madeira. Aliás, já não há tanto dessa madeira no mundo. Mas há os mortos que nunca morrem. Como o Che.

E, dos mortos que nunca morrem, é preciso honrar a memória, merecer seu legado, saber entendê-lo. Não nas camisetas: nos sonhos, nas esperanças, nas certezas. Para que eles não morram jamais. Como o Che. 

artigo publicado no Carta Maior.

Educação e Sociedade – uma relação indissociável

17:22 Postado por Diego Pitirini

A educação ou funciona como instrumento que é utilizado para facilitar a integração das gerações dentro da lógica do sistema presente e para garantir a conformidade com ele, ou se torna uma prática de ‘liberdade’, um meio pelo qual homens e mulheres se relacionam de forma critica e criativa, com a realidade e descobrem como participar na transformação do seu mundo.”
-Paulo Freire

O foco central de atuação do movimento estudantil é o debate de educação. É a porta de entrada do estudante para uma compreensão maior da realidade em que ele está inserido. Logo, faz-se fundamental compreender a essência do processo educativo para poder transformá-lo.

Vivemos em uma sociedade marcada pela divisão em classes sociais e profundas desigualdades sociais. No entanto, suas contradições e as condições para sua reprodução não se dão apenas no âmbito econômico e das relações de produção, mas sim, emergem para outras dimensões da vida social, estendendo-se ao nível político, ideológico e cultural.

Esta análise nos leva a conceber que a educação não pode ser compreendida fora do contexto histórico-social concreto. Ela, por ser uma prática social está imersa na sociedade. Bem como, por ser social, também é essencialmente política e ideológica, atuando no sentido de transmitir os modelos sociais, reproduzir a força de trabalho, qualificar os quadros dirigentes, formar consciências, e difundir idéias em relações pedagógicas que visam à ocultação da realidade, de forma a que as pessoas não percebam que existe a exploração do homem pelo homem, garantindo assim a manutenção das desigualdades na sociedade capitalista.

Logo, desmistificam-se as idéias que consideram a educação “algo neutro” ou um ente isolado da sociedade. Ela reflete suas contradições, sua base material e o seu modo de organização e funcionamento.

Também faz-se necessário lembrar que a educação não é a mesma para todos e que não há educação para todos. Os filhos dos setores dominantes formam-se em escolas bem equipadas, enquanto os filhos dos trabalhadores muitas vezes não completam nem o ensino básico.

Embora em nossa sociedade, os sistemas de ensino tenham sido concebidos para reproduzir a ordem social dominante, seus valores, “visão de mundo” e ideologia, o processo de constituição da escola é um processo contraditório que permite a abertura de brechas em favor da disputa por alternativas educacionais significativamente diferentes e emancipadoras. Disputa essa que está diretamente ligada à disputa mais geral de hegemonia da sociedade.

Desta forma, defendemos a educação como um direito universal, pois estamos entre aqueles que entendem que o acesso ao conhecimento e à formação intelectual é condição fundamental para o desenvolvimento social e a elevação do nível de consciência dos povos. A educação, assim, é um bem público que não pode constituir-se enquanto privilégio de uma minoria e deve ser garantido pelo Estado com recursos públicos, condição para a manutenção de seu caráter laico, bem como da liberdade e autonomia pedagógica e científica necessárias a seu exercício.

Portanto, cabe ao movimento estudantil em seus espaços de atuação, aliando-se aos demais movimentos sociais da classe trabalhadora, aprofundar a luta por uma educação contra-hegemônica e libertadora, que caminhe na contramão da lógica do capital. Uma educação que visa a elevação da consciência política de estudantes e educadores como resultado da sua inserção crítica na realidade tornando-se ferramenta de libertação dos trabalhadores e setores populares, em que o processo de aprendizagem se torne consciente, e não alienado, sendo assim uma das forças capazes de contribuir na luta pela construção de uma nova sociedade, livre de toda a opressão e exploração.


Por uma Universidade Democrática e Popular

A Universidade é uma instituição milenar que, ao longo da história passou por profundas transformações e conforma vários modelos. Podemos situá-la como herdeira das academias do mundo greco-romano. Em sua concepção moderna, no entanto, surge junto com as grandes cidades na Europa do século XII e ao longo de sua difusão pelo mundo é marcada pela época e pelas características sociais, culturais e econômicas de cada ente político em que se desenvolveu.

Atravessou o Atlântico e nos primeiros anos de colonização, alcançou as antigas possessões espanholas na América, a exemplo das universidades de Lima (1551), México (1553), Córdoba (1613), entre outras. Mais do que instituições de ensino, essas universidades nasciam com a clara tarefa de fazer frente ao elevado desenvolvimento das civilizações pré-colombianas, participando do extermínio físico e cultural desses povos.

No Brasil, a universidade é uma instituição de formação recente e fragmentada. Ao contrário da colonização espanhola, os filhos das elites coloniais do Brasil tinham que ir a Coimbra ou outras universidades européias para atingir os estudos superiores.

A formação do ensino superior no Brasil recebeu diretamente a influência do modelo francês de universidade, baseada na reunião de escolas isoladas, destinada quase que exclusivamente às profissões liberais e intimamente ligada à formação das elites e dos quadros dirigentes do Estado.

As instituições de ensino superior ganham corpo nas primeiras décadas do século XX, a partir das faculdades criadas no século anterior, mas é na fundação da Escola de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (1934) e na Universidade do Distrito Federal, no Rio de Janeiro (1934-1939), que encontramos, de fato, as primeiras universidades do país.

Neste período, iniciativas inovadoras que eventualmente surgiam defendidas por intelectuais como Anísio Teixeira, entre outros, encontravam grandes limites para serem realizadas e tão logo eram frustradas ou desarticuladas.

Nascia, assim, a universidade brasileira. Uma universidade para poucos, marcada por uma orientação conservadora em rígidos currículos, cátedras vitalícias e divorciada da realidade social e cultural do seu país.


A rebelião de Córdoba e a hora americana


Homens de uma República livre, acabamos de romper a última cadeia que, em pleno século XX, nos atava à antiga dominação monárquica e monástica. Resolvemos chamar todas as coisas pelos nomes que têm. Córdoba se redime. A partir de hoje contamos para o país uma vergonha a menos e uma liberdade a mais. As dores que ficam são as liberdades que faltam. Acreditamos que não erramos, as ressonâncias do coração nos advertem: estamos pisando sobre uma revolução, estamos vivendo uma hora americana.

(…)

As universidades foram até aqui (…) o lugar onde todas as formas de tiranizar e de insensibilizar acharam a cátedra que as ditasse (…) chegando a ser assim fiel reflexo destas sociedades decadentes que se empenham em oferecer este triste espetáculo de uma imobilidade senil. Por isso é que a ciência frente a essas casas mudas e fechadas, passa silenciosa ou entra mutilada e grotesca no serviço burocrático.(…)

(trechos do Manifesto de Córdoba, 21 de Junho de 1918)


A que(m) serve a Universidade? A que(m) se destina o conhecimento que nela é produzido e difundido? Quem a ela tem acesso? Qual papel ela cumpre diante dos grandes desafios da sociedade? São essas e outras perguntas que movem a ação do movimento estudantil e fazem com que tão antiga quanto a história da universidade seja a luta por sua transformação.

Há 92 anos, estudantes da então conservadora e clerical província de Córdoba, na Argentina, fariam dessas perguntas o mote de um grito que ecoaria aos quatro cantos do mundo e não mais seria silenciado. Oprimidos por um modelo de universidade tutelado pela Igreja e pelas oligarquias, a Revolta de Córdoba, em 1918, lançaria um grande movimento pela Reforma Universitária, impulsionando lutas estudantis por várias gerações e países.

Seu conhecido Manifesto (“Da juventude argentina de Córdoba aos homens livres da América”) sintetiza o sentimento da rebelião e “reivindica um governo estritamente democrático (...), que na comunidade universitária, a soberania, o direito de dar-se governo próprio radica principalmente nos estudantes”. Entre as principais reivindicações, os estudantes exigem o co-governo tripartite e igualitário da universidade, com a eleição democrática dos dirigentes universitários e a participação estudantil nos órgãos diretores; autonomia da universidade, ingresso público para a carreira docente e extensão universitária. O impasse gerado provoca uma intervenção do governo argentino que, pressionado pelo movimento, incorpora as mudanças reivindicadas e as estende por todas as universidades do país.

Posteriormente, quando a correlação de forças volta a ser favorável aos setores conservadores, esses avanços são interrompidos, explicando o fato de que grande parte das reivindicações dos revoltosos de Córdoba permanece, 92 anos depois, atual. Fica demonstrado para o movimento estudantil que a sustentação de uma verdadeira reforma da universidade só logrará êxito quando acompanhada de uma profunda transformação das sociedades que lhe servem de berço.

A partir daí a bandeira da Reforma Universitária ganha outros países e confunde-se com a própria história do movimento estudantil, conquistando uma série de mudanças progressistas nas universidades. Sua defesa está vinculada à necessidade de transformar a universidade em um espaço de reflexão, produção e difusão de conhecimento e cultura que estejam a serviço dos interesses das maiorias. Uma universidade sem muros, aberta ao seu povo, comprometida com a transformação da sociedade e não com a manutenção dos privilégios de uma minoria dominante.


A luta pela Reforma Universitária no Brasil

Os ventos de Córdoba chegam ao Brasil ainda pelos idos dos anos trinta com as primeiras universidades do nosso país e desde o surgimento da União Nacional dos Estudantes, em 1937, também está presente nas reflexões e debates do movimento estudantil.

Mas é a partir do final da década de 50 e início dos anos 60 que a luta por mudanças estruturais na educação ganha novo fôlego na sociedade brasileira. Assumia especial importância a disputa de projetos para a expansão da educação superior. Neste terreno, o ano de 1961 é bem ilustrativo: no mesmo ano em que nascia a Universidade de Brasília, com uma concepção inovadora e mais integrada, era aprovada no Congresso Nacional uma Lei de Diretrizes e Bases da Educação com forte conteúdo privatista.

A tensão da disputa entre esses distintos projetos educacionais coincide com a polarização política vivida à época pelo país e foi acompanhada por um novo impulso das mobilizações estudantis, a exemplo da Greve Geral do 1/3 desencadeada pela UNE em favor da democratização das universidades com a gestão paritária, que paralisou por 3 meses quase todas as 40 universidades do país.

Sobretudo a partir do impulso dado pelo governo João Goulart às Reformas de Base, a reforma universitária encontra espaço para ser pautada como bandeira prioritária da UNE. Estava sintonizada com as reivindicações por mudanças estruturais da sociedade, e buscava transformar a universidade em um espaço mais democrático, mais popular, e comprometido com a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

Como parte dessas lutas e debates pela Reforma Universitária, foram realizados três Seminários da UNE sobre o tema nas cidades de Salvador (1961), Curitiba (1962) e Belo Horizonte (1963), enfatizando o papel da universidade naquela sociedade em mudanças e a centralidade da democratização interna das instituições e a ampliação do seu acesso às camadas populares.

Este rico processo de mobilização estudantil é interrompido com o advento do golpe civil-militar de 1964. A partir deste momento, o movimento estudantil passa a ser duramente perseguido e a universidade cerceada de suas iniciativas críticas e emancipadoras. Sintetizada nos Acordos MEC-USAID, a reforma universitária é esvaziada de seus propósitos progressistas.

A partir de então, o discurso de reforma incorporado pelos militares busca adequar o sistema de ensino superior ao projeto de modernização conservadora, atendendo assim a alguns setores do capital - que necessitavam de determinado tipo de mão-de-obra qualificada - e respondendo ao desejo de ascensão social dos setores médios.

Mesmo com a resistência do movimento estudantil, inclusive na clandestinidade, são impostas medidas como a implantação do sistema de créditos (diluindo a convivência estudantil), a unificação do vestibular, a departamentalização das universidades, entre outras. Ademais, em atendimento à forte demanda, estimulou-se uma profunda massificação do ensino superior – sobretudo privado – traduzidos em números reveladores: dos aproximadamente 100 mil estudantes de graduação presentes no começo da década de sessenta passaríamos a mais de 1 milhão na segunda metade da década seguinte. Se em 1964 as vagas nas universidades públicas representavam 60% do total, já em 1985 representavam apenas 30%.

A universidade brasileira – alcançada pelo esgotamento do modelo de desenvolvimento conservador - chegaria aos anos 80 em profunda crise estrutural e financeira. Pressionada pelo processo de reorganização do movimento estudantil e dos demais movimentos de educação, seu desmonte e caráter excludente volta a ser questionado. Como parte do processo da Assembléia Constituinte, há intensa disputa entre os defensores da escola e da universidade públicas e os aliados do ensino privado.


A onda neoliberal

Nos anos 1990 o advento do neoliberalismo atingiu em cheio as universidades, já afetadas profundamente pela crise dos anos 1980. As mudanças em curso na forma de organização da produção capitalista visavam superar a crise de acumulação que havia se iniciado na década de 1970. Um de seus pilares, pois, era a abertura de setores, historicamente de competência do Estado, à exploração direta do capital. Isso ocorreu com as telecomunicações, com a energia, com a previdência e a saúde. E ocorreu, também, com a educação.

Apoiando-se assim no discurso de que a crise do Estado nacional-desenvolvimentista era fundamentalmente uma crise fiscal e de gigantismo estatal, os governos neoliberais passaram a investir de modo pesado no desmonte da estrutura educacional pública e na expansão do ensino privado. Com o forte amparo das orientações de organismos multilaterais como o Banco Mundial, buscava-se inserir a educação nos acordos comerciais e no debate público não mais como um direito, mas como serviço. Sem o alcance do Estado, deveria servir aos ditames do mercado.

Coerente com esses propósitos, o governos neoliberal de Collor tentou iniciar e o de FHC implementou, através das duas gestões do ministro da educação Paulo Renato (ex-diretor do Banco Mundial e Secretario de Educação do Serra em SP) à frente do MEC, uma série de mudanças no ensino superior brasileiro. Todas elas guardando um sentido comum: fortaleceram o ensino privado e enfraqueceram o ensino público. Um dos pontos centrais, barrado pelos movimentos sociais, era a proposta de Autonomia Financeira para as Universidades Públicas, que na prática significava que estas deveriam se auto-financiar, com cobranças de matrículas, mensalidades, vendas de serviços, etc.

O desmonte da universidade pública seguia a passos largos com a redução dos investimentos estatais e a privatização interna, através de mecanismos como as fundações privadas de “apoio”. Ao mesmo tempo, a expansão do ensino privado é incentivada por empréstimos do BNDES e facilitada pelo Conselho Nacional de Educação, que abandona sua função reguladora para ser conivente com os interesses privados na educação do país.

São tempos difíceis para a universidade pública. Da parte do movimento estudantil é exigida muita resistência e luta contra esse modelo, a exemplo das greves nacionais de 1998 e 2001 e o Boicote ao Provão. A unidade do movimento de educação também estaria presente na importante ação do Fórum em Defesa da Escola Pública e na formulação do Plano Nacional de Educação - Proposta da Sociedade Brasileira, em 1997.


O Governo Lula na Educação

A primeira eleição de Lula em 2002 representou, entre os setores sociais comprometidos com a luta pela universidade pública, um claro desejo por uma reversão do processo de desmonte da universidade brasileira. O momento que se anunciava parecia propício para uma discussão de fôlego acerca dos rumos do ensino superior no país, que pudesse culminar com transformações profundas, no sentido do fortalecimento do caráter público da universidade brasileira, de sua democratização e da ampliação de sua capacidade de produzir conhecimento de forma autônoma e socialmente referenciada.

As primeiras iniciativas tomadas pelo governo no âmbito da educação superior, contudo, não apontaram no mesmo sentido das bandeiras históricas do movimento. Embora a idéia de uma reforma universitária tenha pautado desde o início as ações do governo, as propostas então elaboradas foram contaminadas pelo conservadorismo da política econômica adotada, sobretudo no primeiro mandato, que implicava em um entrave para a expansão das universidades públicas em função dos poucos recursos destinados aos investimentos públicos, assim como também comprovaram a indisposição do MEC em confrontar os tubarões do ensino.

Nos marcos da orientação geral do governo naquele período, sua política de alianças, de governabilidade institucional e de conciliação entre público e privado, uma reforma que contemplasse as reivindicações do movimento de educação tinha sérias chances de retroceder e contemplar os interesses do setor privado, dado o caráter desigual da disputa de rumos do governo e o peso do setor conservador no Congresso Nacional.

Dentre as ações do governo Lula para o Ensino Superior podemos destacar:

- a retomada de investimentos nas IFES (Instituições Federais de Ensino Superior), que passou de R$ 9 bilhões em 2002 para R$ 20 bilhões em 2010;

- retomada de concursos para professores e servidores;

- ampliação do número de matrículas, via ProUni, criação de 134 novas Extensões das IFES e 14 novas IFES, Educação a Distância, criação de 214 IFETs (Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia) e com o Reuni (Programa de Reestruturação e Expansão das IFES), alterando o perfil dos estudantes universitários brasileiros;

- ampliação da relação público-privado, com a Lei de Inovação Tecnológica, Lei das PPP (Parcerias Público-Privadas) e os decretos que regulamentam a relação das Fundações “de apoio” e as IFES;

- a política de Avaliação Institucional com o SINAES (Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior);

- a elaboração de um anteprojeto de Lei Orgânica para o Ensino Superior, atual PL7200, que encontra-se tramitando com mais 13 projetos em conjunto no Congresso Nacional;

- a democratização do acesso e permanência, com o estímulo a adoção das políticas de Ações Afirmativas e o PNAES – Plano Nacional de Assistência Estudantil, que em 2010 investiu R$ 300 milhões nas instituições federais;

- o uso do novo ENEM com forma de ingresso ao ensino superior.

Frente a este conjunto de medidas, as divergências em torno da análise da política educacional do governo federal - que são legítimas e mesmo necessárias - acabaram dando lugar a uma profunda divisão e dispersão do movimento de educação, enfraquecendo-o. No primeiro mandato de Lula, prevaleceu em amplos setores uma intervenção pautada quase que exclusivamente pelo imediatismo em responder às ações governamentais, ainda que contra ou a favor, reduzindo o movimento a disputismos internos.

Enquanto a direção majoritária da UNE preocupava-se apenas em defender acriticamente as políticas do governo, em uma postura muito governista, nós e outros setores da oposição na entidade, fizemos duras críticas aos projetos que consideramos negativos para educação pública. No nosso ponto de vista, trata-se de conquistar avanços e impedir retrocessos a partir do nosso projeto de educação. Já para os setores da extrema-esquerda trata-se exclusivamente de tentar fazer oposição ao governo e desgastá-lo. A fragmentação do movimento levou a sua estagnação e favoreceu o lobby do ensino particular.

O aprendizado que trouxe o debate sobre a Reforma Universitária foi significativo. A divisão e ausência de uma proposta consolidada do movimento de educação, bem como a falta de grandes mobilizações impediram uma intervenção que debatesse e mobilizasse a sociedade brasileira em torno de nossas propostas, de nossa Universidade, aberta e voltada aos interesses populares.

É fato que o Governo Lula, em que pese os limites, exibe avanços consideráveis no campo da educação pública, sobretudo a partir do segundo mandato, em especial com a expansão das instituições federais, a ampliação dos recursos par educação e a inclusão de setores populares no ensino superior. Ao mesmo tempo é necessário considerar que a estratégia de conciliação com a hegemonia do ensino privado ainda continua presidindo as ações do governo federal, que não tomou medidas significativas no sentido de regulamentar a educação paga. Infelizmente também não foi prioridade para o MEC atuar no sentido da democratização da gestão das instituições de ensino, alterando suas estruturas por meio de alterações na legislação vigente.

A partir da polarização entre as candidaturas Lula e Alckmin em 2006, abriu-se uma nova janela de oportunidades para a defesa de avanços para a educação pública. No movimento estudantil, amplos setores da UNE passaram a reivindicar a estratégia de apresentar uma proposta de reforma universitária dos estudantes, opinião que também foi fruto de uma forte intervenção da tese Reconquistar a UNE no CONUNE de 2007. Naquela oportunidade dizíamos que o movimento estudantil estava “perdendo a iniciativa de elaborar a sua proposta de transformação da universidade brasileira, e efetivamente disputá-la, buscando incidir sobre as decisões governamentais”.

Fruto do acerto desta posição, em 2009, no 12º CONEB em Salvador, foi aprovado a proposta de Reforma Universitária da UNE. Ocorre, porém, que os estudantes brasileiros não conhecem esta proposta, uma vez que foi elaborada por poucas mãos e não foi alvo de discussões nas universidades. Nem mesmo durante o conselho foi possível que os estudantes lá presentes debatessem e conhecessem o projeto, já que os grupos de discussão não garantiam a participação de todos. A elaboração do projeto de reforma universitária da UNE foi um gesto político importante do movimento estudantil. Entretanto, mesmo sendo resultado de uma postura menos pautada pela agenda do governo federal para a educação, o projeto ainda deve ser melhor debatido e atualizado pelos fóruns do movimento.


Novos desafios – Dilma presidente

Na conjuntura eleitoral de 2010, não titubeamos em apoiar a candidata Dilma Rousseff para a presidência da república, por termos a clareza de que sua derrota significaria um enorme retrocesso, tanto para o Brasil, como para a América Latina, e que as possibilidades de avançar na democratização da educação brasileira seriam muito menores do que em um governo Serra, que no estado de São Paulo implementou uma política educacional retrógrada com Paulo Renato como Secretário de Educação, indicando a reitora da USP não eleita pela comunidade e recebendo a justa greve de professores estaduais a cacetadas.

Acreditamos que estamos em um contexto mais favorável a implementação de uma política educacional mais avançada e centrada no fortalecimento do ensino público, desde que o movimento saia da retranca e das demarcações internas.

Não cabe a UNE e ao conjunto do Movimento Estudantil ficar esperando para ver o que Dilma fará na área da educação para aí então tomar uma posição. Nossa posição é pela Educação Pública, Gratuita, Democrática, Popular e de Qualidade! Cabe a nós, a partir desta bandeira mais geral, nos unir para incidirmos sobre o governo para pautar seus rumos, construindo muitas lutas nas escolas e universidades. O empresariado da educação, os defensores do ensino privado, já definiram sua agenda e pressionam o governo para implementá-la – como aliás, fazem desde 2003. E o Movimento Estudantil, vai ficar parado?

Para superarmos esses limites a União Nacional dos Estudantes chega ao 13º CONEB com uma tarefa desafiadora: iniciar um processo de retomada das lutas e debates em torno do projeto de universidade do movimento estudantil, que deve ser amplamente discutido e atualizado nos marcos do contexto que estaremos situados no próximo período. O resgate do acúmulo histórico do movimento de educação é fundamental. Uma iniciativa que deve sistematizar o conjunto de reivindicações, incentivar novas formulações do movimento de educação e ser capaz de impulsionar a luta por uma Universidade Democrática e Popular.

Outro desafio reside na retomada do caráter mobilizador e militante do movimento estudantil. Sem luta política e gente na rua, nosso programa não irá além de um mero conjunto de intenções. É imprescindível o amplo envolvimento da rede do movimento estudantil numa grande campanha, que agregue mobilizações, seminários, comitês, plenárias, aulas públicas em torno do projeto de reforma universitária da UNE.

O atual período exige transferir os setores que passaram a ser alvo da exploração capitalista para espaços públicos não-mercantis, sob a orientação e gestão do Estado. Portanto, o sentido estratégico da luta da UNE e do conjunto do movimento de educação deve estar orientado para uma intensa ofensiva político-ideológica em favor de uma forte regulamentação do ensino privado e do fortalecimento do setor público estatal da educação, mobilizando os setores populares, principais afetados pelos impactos da crise nos setores público e privado da educação.

Essa luta por mudanças estruturais na educação e na universidade deve ser parte de um programa maior de reformas democrático-populares, de corte anti-monopolista, anti-latifundiário, anti-imperialista e anti-neoliberal. Neste processo devemos ter clareza de que tanto a elaboração quanto a luta por uma reforma estrutural da universidade brasileira deve necessariamente, envolver as classes trabalhadoras e os demais movimentos sociais. Assim indicaremos de maneira inquestionável que a luta por uma universidade democrática e popular é uma luta que tem sua legitimidade construída nos interesses da ampla maioria da sociedade.

E a primeira batalha que se travaremos no governo Dilma é a da construção do Novo Plano Nacional de Educação – PNE 2011-2020.


Por um PNE Democrático e Popular!

A construção do novo Plano Nacional de Educação (2011-2020) iniciou-se na Conferência Nacional de Educação (CONAE), realizada em abril de 2010 em Brasília e precedida pelas etapas municipais, regionais e estaduais em 2009, mobilizando mais de 400 mil pessoas ao todo. Reunindo mais de 3 mil delegados de todo país, os principais objetivos da CONAE eram definir os parâmetros do Sistema Nacional de Educação e as diretrizes e estratégias de ação do novo PNE, enquanto política de Estado.


Rumo ao terceiro Plano Nacional de Educação

Através do movimento da Escola Nova no início dos anos 30, a Constituição Federal de 1934 e todas as posteriores (com exceção da de 1937) continham em seus textos a atribuição por parte da União da elaboração do Plano Nacional de Educação. Nos anos de 1936 e 1937 foi elaborado pelo ministério e o Conselho Nacional de Educação uma proposta de PNE, que após ser enviado à Câmara dos Deputados, foi abortado devido ao golpe do Estado Novo.

Com a redemocratização do país, volta à cena a discussão sobre os rumos da educação nacional, e apenas após treze anos de discussões no Congresso entre os setores privatistas, dirigidos por Carlos Lacerda e a Campanha em Defesa da Escola Pública, encabeçada por Florestan Fernandes, foi homologada a primeira LDB em 1961.

Apenas em 1962 foi estabelecido o primeiro Plano Nacional de Educação. Este não foi um projeto de lei. Foi um conjunto de iniciativas propostos pelo Ministério da Educação e Cultura e aprovado pelo Conselho Federal de Educação, constituído de metas quantitativas e qualitativas a serem alcançadas em oito anos, voltadas principalmente para a alfabetização da população, medidas estas que não foram viabilizadas devido ao golpe civil-militar de 1964.

Na Constituição Federal de 1988 é retomada a questão da necessidade de implantação de um Plano Nacional de Educação, com força de lei, ficando assegurado em seu artigo 214. Após a aprovação da nova Lei de Diretrizes e Bases (Lei nº 9.394/96) de forma autoritária pelo governo FHC, institui-se nesta que o governo possui o prazo de um ano para elaborar e enviar ao Congresso Nacional o Plano Nacional de Educação, com diretrizes e metas para os dez anos seguintes.

Os movimentos sociais antecipam-se ao governo e realizam dois CONEDs – Congressos Nacionais de Educação, onde elaboram o Plano Nacional de Educação, apresentando em 10 de fevereiro de 1998 na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 4.155/98.

Este Plano, que ficou conhecido como PNE – Proposta da Sociedade Brasileira, representou a síntese do acúmulo do debate e da luta educacional empreendido pelos movimentos sociais nas últimas décadas, alicerçado em um rigoroso diagnóstico da realidade brasileira, sua divida social e as medidas necessárias para superar esta situação, em contraposição as políticas privatistas do governo vigente.

O Ministério da Educação por sua vez, elaborou a sua proposta de Plano Nacional de Educação (PNE–MEC), protocolando-o na Câmara dos Deputados em março de 1998, sob o nº 4.173/98, sendo apensado ao PL 4.155/98 por este possuir precedência. Assim, iniciou-se a tramitação do PNE em um processo único, passando por uma série de embates em plenário e a pressão externa de diversos setores da sociedade. O relator do Projeto de Lei optou por apresentar uma proposta substitutiva (substitutivo Marchesan), que após mais um tempo de tramitação e recebimento de sugestões foi finalizada.

Em 09 de Janeiro de 2001, o presidente FHC sancionou a Lei nº 10.172/01 que instituiu o Plano Nacional de Educação, com vetos a nove metas, a maioria sobre a ampliação de recursos financeiros para educação e valorização do magistério e servidores. Vetou-se assim, algumas das principais propostas vitoriosas do PNE da Sociedade Brasileira no sentido da valorização e democratização da educação nacional. Um dos principais pontos do PNE da Sociedade Brasileira era a destinação de 10% do PIB para educação, sendo aprovada a meta de 7%, ainda assim vetada por FHC, pois entendia que as metas do PNE poderiam ser atingidas apenas com um melhor gerenciamento dos recursos já destinados. Isto comprometeu e inviabilizou diretamente o cumprimento das metas estabelecidas no Plano, que até hoje, passados quase 10 anos de sua aprovação e sem a retirada dos vetos por parte do Governo Lula, não foram atingidas.


A CONAE e o Movimento de Educação

Acreditamos que foi um acerto político por parte do Governo Lula construir a elaboração do novo Plano Nacional de Educação a partir de um processo de Conferências desde a base. Diferentemente dos Planos anteriores, neste momento o conjunto da sociedade civil teve a oportunidade de defender suas propostas e incidir no PNE e no Sistema Nacional de Educação.

Diferentemente dos períodos anteriores também, é a postura do movimento educacional frente à questão. Se no passado havia uma maior unidade de intervenção e construção coletiva das propostas para as políticas educacionais brasileiras por parte dos setores que compõem o movimento estudantil e dos trabalhadores em educação (servidores e docentes), permitindo a construção de sínteses e ações coletivas, o divisionismo e a dispersão dos movimentos sociais enfraqueceram a possibilidade de incidirmos com peso nas resoluções das Conferências de Educação, abrindo espaço para os setores conservadores e o lobby da educação privada.

Entendemos como um grande equívoco a opção dos setores de ultra-esquerda em não participar do processo da Conferência Nacional de Educação, enquanto delegados ou no mínimo observadores, a exemplo da direção do ANDES-SN que se retirou da Comissão Organizadora. Estes setores acreditavam que a Conferência seria apenas um meio para o governo legitimar suas políticas e que, sendo assim, participar desta significaria referendar as mesmas. Ocorre que omitir-se em participar neste espaço foi uma irresponsabilidade perante a disputa entorno do conteúdo do PNE e o debate em defesa do fortalecimento da educação pública que historicamente estes coletivos e movimentos construíram conosco.

De antemão já deixamos claro que não faremos coro com estes setores quando da homologação do PNE 2011-2020, afirmarem “este não é o nosso PNE”, pois, na lógica do “quanto pior melhor”, se recusaram a discuti-lo. Por outro lado, não nos omitiremos em apresentar nossa avaliação crítica do processo e do conteúdo do novo PNE, mantendo nossa autonomia frente ao mesmo e construindo lutas entorno de nossas bandeiras, possuindo a legitimidade de ter nos esforçado em disputá-lo e caso necessário, cobrar alterações.

Avaliamos como muito negativo o atual grau de desarticulação do movimento social de educação e do Fórum em Defesa da Escola Pública, gerada principalmente pelas divergentes análises da conjuntura educacional no decorrer do Governo Lula, em detrimento da construção da unidade entorno de nosso projeto histórico e atuação comum no atual cenário. A fragmentação da esquerda apenas fortalece a direita na disputa dos rumos do governo federal.

Da mesma forma, compreendemos que poderia ter sido mais expressiva a atuação dos setores do movimento educacional que optaram por disputar os rumos da CONAE. A falta de orientação por parte da UNE e da UBES para o conjunto do movimento estudantil, por exemplo, reduziram o potencial e a qualidade da intervenção dos estudantes presentes nas Conferências de base. O processo da CONAE deveria ser aproveitado pela UNE defender desde a base e propagandear nos municípios o nosso Projeto de Reforma Universitária (atual PL 5.175/09), construindo uma forte campanha. Apesar da UNE e UBES possuírem uma boa visibilidade na CONAE, a maioria dos estudantes delegados na CONAE não era militante do movimento estudantil.

Certamente se tivessem ocorridos um maior grau de unidade e mobilização do movimento educacional em toda CONAE, propostas mais avançadas teriam chego à etapa nacional como a composição paritária em todos os órgãos colegiados das universidades e o fim das Fundações ditas “de apoio” às IFES. Mas ainda assim, graças a forte participação dos sindicatos da educação básica e a reduzida presença dos setores conservadores na CONAE, podemos afirmar que o texto final aprovado pela Conferência é no geral positivo, no sentido de priorizar o fortalecimento da educação pública.


Por um PNE Democrático e Popular

Na CONAE foram discutidas as bases para a construção do Sistema Nacional de Educação, como forma de efetivar o regime de colaboração entre a União, Estados e municípios e promover a articulação dos sistemas de ensino em todos os níveis, etapas e modalidades, com a integração do PNE com os Planos Estaduais e Municipais de Educação, superando a visão fragmentada de educação e visando a resolução do grande déficit educacional brasileiro, tanto em termos de acesso, como de qualidade do ensino, financiando o sistema público e regulamentando o privado.

Também foi deliberado a criação e institucionalização do Fórum Nacional de Educação, como instância consultiva, de articulação, organização, acompanhamento da política nacional de educação e de coordenação permanente das conferências nacionais de educação, no âmbito do Sistema Nacional de Educação. Acreditamos que este Fórum deve ser um espaço amplamente representativo no que diz respeito a participação dos movimentos sociais e sindicatos.

Em relação ao PNE 2011-2020, boa parte das bandeiras do movimento de educação foram contempladas na definição de suas diretrizes básicas. No entanto, a CONAE não aprovou o novo PNE, ela apenas deliberou por suas orientações específicas e gerais, que serão aprovadas sob projeto de lei no Congresso Nacional ainda em 2011. Logo, nem tudo que foi definido na Conferência constará no PNE ao final do processo e várias propostas poderão ser modificadas. Sabemos que a influência do lobby do setor privado da educação é muito forte no Congresso Nacional, inclusive no interior da ampla base governista recém-eleita, de forma a que a versão final do PNE seja muito recuada em suas metas ou venha a atender os interesses dos tubarões do ensino, que defendem a destinação de recursos públicos para as universidades pagas, por exemplo. Ou seja, a disputa não acabou! E esta luta se dará tanto no âmbito institucional do parlamento, como também no plano social, nas ruas.

Assim, quando pautamos a construção de um PNE Democrático e Popular, estamos afirmando o caráter Público, Gratuito e de Qualidade da educação que queremos, voltada para as maiorias, que contemple a diversidade do nosso povo, com a universalização do acesso em todos os níveis através do financiamento estatal. Este caráter deve ser reafirmado e implementado pelo PNE no próximo período, enquanto política de Estado.

Para isto, o movimento de educação deve permanecer constantemente mobilizado para que não tenhamos nenhum retrocesso no Congresso, para que Dilma não vete nenhuma proposta avançada e seu governo trabalhe no sentido de implementar o PNE.

À UNE e o movimento estudantil cabe pautar nossas propostas ao PNE nas ruas e nas universidades, articulando a luta social com a luta institucional. Quanto maior for a pressão, maiores são as possibilidades de que sejamos vitoriosos. Também devemos atuar no sentido de rearticular o Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, de forma a que todo o movimento de educação se envolva neste processo e lute pela construção e implementação de um PNE Democrático e Popular.


Principais deliberações da CONAE que devemos garantir que sejam aprovadas no PNE:

- investimento de 10% do PIB em educação até 2014;

- 50% do Fundo Social do Pré-Sal devem ser destinados para educação;

- recursos públicos devem ser investidos apenas na educação pública, em todos os níveis e modalidades de ensino, como forma de desmercantilizar a educação;

- fim dos cursos pagos de pós-graduação nas IES públicas;

- ampliar as vinculações orçamentárias da educação da União de 18% para, no mínimo, 25% e de 25% para, no mínimo, 30% dos estados, DF e municípios;

- estabelecer um Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Superior Pública;

- criação de uma Lei de Responsabilidade Educacional;

- alocar recursos financeiros específicos para a expansão da graduação nas instituições públicas no período noturno;

- “regulamentar o ensino privado em todos os níveis educacionais, limitando a participação de capital estrangeiro na educação, retomando os marcos da educação como direito e não como mercadoria, garantindo fiscalização efetiva para evitar abusos”;

- deve ser incrementada a expansão do ensino superior público presencial, mediante programas de expansão democraticamente discutidos com a comunidade universitária e com a sociedade em geral e com interiorização deste nível de ensino, levando em consideração as reais necessidades da população; fortalecer as licenciaturas presenciais;

- em relação ao Ensino Superior, até 2020 60% das matrículas devem ser em instituições públicas e 40% em privadas;

- reserva de vagas nas universidades de 50% para estudantes egressos de escolas públicas, respeitando a proporção de negros/as e indígenas em cada estado de acordo com os índices do IBGE;

- estabelecer programas de apoio à permanência dos/das estudantes nas instituições públicas, considerando-se que há a necessidade de provocar uma grande expansão dos cursos de graduação presenciais;

- consolidar a pós-graduação em todo país, gerando condições de funcionamento dos programas e a abertura de novos;

- garantir recursos orçamentários para que as universidades públicas possam definir e executar seus próprios projetos de pesquisa, propiciando uma efetiva autonomia de pesquisa;

- eleições para diretores e reitores de instituições públicas e privadas e formas colegiadas de gestão;

- gestão democrática como princípio para instituições públicas e privadas;

. a livre organização sindical e estudantil deve ser garantida;

- política nacional de avaliação como processo contínuo, não voltada para a punição, “ranqueamento” e classificação das instituições, considerando não apenas o desempenho, mas estrutura, relação professor/estudante, gestão democrática escolar, participação do corpo discente na vida escolar, carreira e salário dos trabalhadores, levando em conta a avaliação externa e a auto-avaliação, com caráter diagnóstico, visando a superação de dificuldades através de políticas públicas;

- erradicar o analfabetismo e universalizar a educação básica;

- assegurar o cumprimento do Piso Salarial Nacional com plano de carreira, no setor público, com ampliação de seus direitos;

- valorização dos trabalhadores em educação, formação inicial e continuada, carreira, salário e condições de trabalho;

- política nacional de formação dos/das profissionais da educação: oferta de cursos de graduação, especialização/aperfeiçoamento e extensão aos/às profissionais da educação pública, em universidades também públicas, como direito dos/das profissionais da educação;

- obrigatoriedade imediata de realização de concursos públicos, como forma de ingresso, para todos os/as profissionais da educação;

- reconhecimento, respeito e valorização das diversidades;

- combate a todo e qualquer tipo de racismo, preconceito, discriminação e intolerância como eixos orientadores da ação, das práticas pedagógicas, dos projetos político-pedagógicos e dos planos de desenvolvimento institucional da educação pública e privada, em articulação com os movimentos sociais;

- apoio da Capes e CNPq à criação de linhas de pesquisa nos cursos de pós-graduação do Brasil que visem ao estudo da diversidade étnico-racial, ambiental, do campo, de gênero, de orientação sexual e de pessoas com necessidades educativas especiais;

- relações étnico-raciais: efetivação do Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana no âmbito dos diversos sistemas de ensino; ampliar a oferta, por parte das instituições públicas, de cursos de extensão, especialização, mestrado e doutorado sobre relações étnico-raciais no Brasil e a história e cultura afro-brasileira, africana e indígena; desenvolver políticas e ações, para o enfrentamento do racismo institucional; criação de mecanismos que eliminem o déficit educacional entre brancos/as e negros/as;

- educação quilombola: construção do Plano Nacional de Educação Quilombola, com a participação do movimento negro quilombola; instituição de um programa específico de licenciatura para quilombolas, com formação específica e diferenciada; e elaboração de materiais didáticos próprios;

- educação do campo no campo: assegurar uma política pública nacional de educação do campo e da floresta como direito, em diálogo com os movimentos sociais campesinos, que assegure a formação humana, política, social e cultural dos sujeitos; desenvolver uma política pública de financiamento da educação do campo; criar políticas de incentivo para os/as professores/as que atuam no campo e incluir a educação do campo na matriz curricular dos cursos de pedagogia e licenciaturas; desenvolvimento de propostas pedagógicas e materiais didáticos coerentes com as realidades locais; reconhecer e institucionalizar as escolas itinerantes e criar creches no campo;

- educação indígena: estimular a criação de mais cursos de licenciatura indígenas dentro da própria estrutura das IES, garantir a ampliação da oferta de educação básica intercultural nas escolas indígenas, nos anos finais do ensino fundamental e no ensino médio; garantir a utilização da(s) língua(s) indígena(s); garantir a participação dos povos indígenas em todos os momentos de decisão, acompanhamento e avaliação relacionados à educação; produzir e distribuir gratuitamente material didático voltadas para questões indígenas;

- gênero e diversidade sexual: constituição de uma educação não sexista, machista ou homofóbica; garantir os recursos para a implementação do Projeto Escola sem Homofobia em toda a rede de ensino; desenvolver programas de formação inicial e continuada, extensão, especialização, mestrado e doutorado, em sexualidade, diversidade e relações de gênero no ensino superior público, visando superar preconceitos, discriminação, violência sexista e homofóbica no ambiente escolar; garantir medidas que assegurem às pessoas travestis e transexuais o direito de terem os seus nomes sociais acrescidos aos documentos oficiais (diário de classe) das instituições de ensino;

- educação especial: garantir as condições para uma Política Nacional de Educação Especial Inclusiva, que garanta o processo de inclusão cidadã na formação de profissionais da educação; fortalecendo o atendimento educacional especializado, que deve ser realizado no contraturno; com a distribuição de livros, materiais didáticos e paradidáticos, equipamentos e mobiliários adaptados; garantir a presença do/da professor/a auxiliar, do/da intérprete/tradutor/a, do/da guia-intérprete, professor/a de Libras para as salas do ensino regular com estudantes inclusos/as e oficializar a profissão de tradutor/a-intérprete de Libras para surdos/as e do/a guia intérprete para surdos/as e cegos/as;

- educação ambiental: garantir por meio de recursos públicos, a implementação e acompanhamento da Lei da Política Nacional de Educação Ambiental e programas de educação ambiental, considerando-a como atividade curricular obrigatória na educação básica e graduação; assegurar a compra direta da merenda das escolas públicas com o/a agricultor/a familiar e as organizações familiares, produtoras de alimentos orgânicos e agroecológicos;

- crianças, adolescentes e jovens em situação de risco: garantir políticas públicas de inclusão e permanência em escolas de crianças e adolescentes que se encontram em regime de liberdade assistida ou em cumprimento de medidas socioeducativas; oferecer educação integral, integrada, básica, profissional, técnica e gratuita aos/às adolescentes que cumprem medidas socioeducativas em regime fechado; considerar no projeto político-pedagógico, as diversidades da juventude;

- educação religiosa: inserir os estudos de diversidade cultural-religiosa no currículo das licenciaturas e em programas de formação inicial e continuada; garantir que o ensino público se paute na laicidade, sem privilegiar rituais típicos de dadas religiões que acabam por dificultar a afirmação, respeito e conhecimento de que a pluralidade religiosa é um direito;

- fortalecimento do caráter público, gratuito e de qualidade da educação brasileira, enquanto direito de todos e dever do Estado.



Revolução Pedagógica

Por uma Formação Integral: Ensino, Pesquisa e Extensão para a Transformação Social

Hoje, mais do que nunca, faze-se necessário repensar os métodos de ensino e o modelo de formação a que somos colocados em nossas universidades. O projeto de Reforma Universitária defendido pelo movimento estudantil deve ir além de melhorias físicas em nossas instituições. É preciso também uma profunda mudança na forma como o conhecimento é produzido e disseminado, alterando a própria organização acadêmica das instituições de ensino.

Cotidianamente somos submetidos a um modelo pedagógico tradicional, pautado numa concepção que vê no estudante uma “vasilha vazia” e que cabe ao professor preenchê-la de conteúdos. Esta educação retórica e ‘bancária’, baseia-se na transmissão verticalizada de técnicas e conteúdos, ao invés da construção coletiva do conhecimento.

A verdade é que os estudantes não agüentam mais esta velha forma de ensinar/aprender reproduzida em nossas escolas e universidades. As grandes expectativas que temos ao entrar na universidade em relação a outros espaços de aprendizagem são logo frustradas pelo velho ‘modelão’ de ensino. Não é possível suportar mais a enganação de estudantes que fingem aprender e professores que fingem ensinar. E se fosse abolida a freqüência obrigatória nas aulas?? Muitas vezes os estudantes preferem estudar em casa, em outro local da universidade ou procurar alternativas, pois não encontram respostas e ânimo para permanecer na sala de aula.

O abandono dos estudos e a repetência são, em muitos momentos, sintomas da insatisfação dos jovens em relação à universidade. Métodos obsoletos de ensino-aprendizagem, avaliações orientadas para a memorização e a própria relação hierárquica que é estabelecida entre estudante e professor explicam porque, em grande medida, “não somos nós que matamos aula, é a aula que nos mata”.

Outro grave problema em nossas universidades é o seu grau de fragmentação e distanciamento da realidade. O ensino universitário tradicional tem sido desenvolvido geralmente de forma desvinculada da experiência, da prática, da realidade social. Urge rompermos com esta concepção estática e fragmentada da produção do conhecimento, que reduz a mesma a especializações disciplinares quase sem contato entre si, com objetos disciplinares recortados artificialmente da realidade social.

Deste modo, a universidade tradicional tem realizado, sobretudo, ensino, em menor grau pesquisa (nem sempre vinculada a problemáticas sociais relevantes), e em menor grau ainda, extensão, o patinho feio do tripé universitário. Este desenvolvimento fragmentado de suas funções tem implicado um empobrecimento da vida universitária e da educação como um todo, longe dos problemas da sociedade.

Transformar essa realidade exige a abertura de um amplo debate nacional sobre o projeto político-pedagógico das universidades brasileiras, incentivando a criação de espaços democráticos nas universidades que estimulem a adoção de métodos didáticos e pedagógicos alternativos. Esse processo deve partir de uma compreensão mais ampla de educação, que não seja restrita as instituições escolares e deve incorporar práticas educativas que dialoguem com as experiências da Educação Popular e da Pedagogia da Alternância.

Nosso projeto de Universidade Democrática e Popular compreende outro modelo pedagógico, baseado na participação, no diálogo e na construção do conhecimento, principalmente, a partir de objetivos traçados de forma coletiva e valorizando os saberes e demandas populares.

No campo da reestruturação acadêmica e curricular devemos repensar o atual modelo de organização universitária e a necessária extinção dos departamentos. Estes se tornaram redutos privilegiados do corporativismo acadêmico e reproduzem uma organização segmentada da universidade. Esta distorção também é percebida na própria estrutura física das universidades, em que os seus blocos, centros, faculdades e institutos são marcados pela falta de comunicação, isolando os estudantes e não permitindo o contato destes com outros campos do saber. Em substituição a estrutura departamental, é preciso constituir estruturas acadêmicas permeáveis à participação democrática da comunidade e à interdisciplinaridade. Já em relação aos currículos, fica patente a necessidade que tem a universidade em incorporar a diversidade social e cultural dos educandos e da comunidade. Uma diversidade não encontrada nos atuais currículos eurocêntricos, sexistas e heteronormativos das nossas universidades.

Para superar o modelo de ensino universitário tradicional é necessário analisarmos a essência do processo educacional em nossa sociedade, lembrando que a educação é um dos principais instrumentos de hegemonia da classe dominante para manter a ordem social vigente. Logo, a existência de uma pedagogia alienante, fragmentada e desvinculada da realidade é uma condição para impedir com que as estruturas da sociedade não sejam questionadas. Porém, cá estamos nós lutando para que as escolas e universidades sejam convertidas em instrumentos de transformação social e aumento do poder das classes populares.

Neste sentido, uma experiência muito interessante que começou a ser colocada em prática na Universidad de la Republica no Uruguai, são os EFI – Espaços de Formação Integral, metodologia de ensino-aprendizagem que implica a integração das três funções universitárias (ensino, pesquisa e extensão), em um núcleo de ensino multidisciplinar (envolvendo professores e estudantes de diversos cursos e disciplinas, dependendo do projeto) em contato direto com a realidade social e em constante diálogo com a população, discutindo suas demandas e alternativas concretas para superá-las, concebendo-a como sujeito e não como simples objeto de pesquisa.

Para promover a curricularização da extensão, de forma integrada à iniciação científica e a renovação das formas de ensino, foram criados os EFI, potencializando o vínculo Universidade-Sociedade sob uma perspectiva dialógica, bidirecional, crítica e emancipadora. Assim, redimensionou-se a importância da extensão universitária, colocando-a no centro do processo pedagógico desde a entrada dos estudantes na Universidade, que passam a desenvolver práticas integrais através de abordagens interdisciplinares e multiprofissionais junto à comunidade.

O princípio pedagógico central dos EFI é a práxis: a prática é a fonte fundamental da reflexão teórica, a qual possibilita novos olhares sobre a intervenção e assim por diante, retroalimentando teoria e prática. Procura-se assim superar as lacunas existentes entre o pensar e o fazer, o ensino e a aprendizagem, entre a formação e a prática profissional, entre esta e outras práticas sociais, vinculando criticamente os saberes acadêmicos e populares na discussão sobre problemas concretos.

Desta forma, ampliando o processo educativo para além da sala de aula e os muros da Universidade, articulando as três funções universitárias de forma integral, redimensionou-se o papel destas e lhes conferiu importância social em um processo educativo transformador, onde todos podem aprender e ensinar ao mesmo tempo.

Esta proposta de renovação do ensino está em curso e caminha no sentido da transformação da própria universidade, sendo um bom exemplo da função social que a educação superior pode cumprir caso orientada por interesses populares.

- Pela livre presença nas aulas;

- Pela redefinição dos métodos de ensino – abaixo a pedagogia tradicional!

- Por outro modelo de avaliação dos estudantes, crítico e participativo, e que possamos avaliar os professores em cada disciplina;

- Fim dos Departamentos e sua substituição por uma organização acadêmica permeável à participação democrática da comunidade e à interdisciplinaridade;

- Reformas curriculares que transformem a formação profissional rumo à compreensão da realidade social;

- Por uma educação voltada para sociedade e suas demandas, com a curricularização da extensão, articulada à pesquisa e ao ensino, de forma integral;

- Realização de COEPES – Conferências de Ensino, Pesquisa e Extensão, integrando Universidade e Sociedade, para discutir o papel e a função social das instituições de ensino;

- Por uma Universidade Integral e Transformadora;


Autonomia Universitária

A idéia de autonomia é indissociável da própria idéia de universidade. O exercício desta autonomia, no entanto, não deve ser confundido como independência ou isolamento da sociedade. Ao contrário, a autonomia da universidade é condição fundamental para que sua função social não seja tolhida por interesses a ela alheios ou externos.

Historicamente, a universidade conviveu com um maior ou menor grau de autonomia, a depender da relação estabelecida com a ordem dominante. Sempre que abrigou idéias, movimentos ou iniciativas que feriam esses interesses, seu “autogoverno” era o primeiro a ser atingido, seus campi invadidos, professores e estudantes expulsos ou perseguidos.

Prevista pelo artigo 207 da Constituição Federal, a autonomia das universidades deve compreender a autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial. Além disso, seu exercício deve estar vinculado ao princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.

A autonomia didático-científica deve conferir à universidade a responsabilidade de estabelecer seus próprios instrumentos de produção e difusão do conhecimento, debatendo de forma democrática os currículos, métodos de ensino e investigação científica que melhor dialoguem com as demandas da comunidade e a pluralidade de visões presentes na sociedade.

Neste sentido, a produção científica e cultural da instituição deve levar em conta sua relevância social, não podendo ser determinada ou apropriada privadamente por interesses empresariais associados a pequenos grupos da burocracia universitária.

Dois projetos que interferem na autonomia das universidades públicas e privadas brasileiras são a Lei de Inovação Tecnológica e a Lei das Parcerias Público-Privadas, ao possibilitarem que as instituições de Ensino Superior celebrem contratos com empresas privadas, com o objetivo de desenvolver pesquisas para estas. Isto permite com que os interesses do mercado passem a determinar de forma mais incisiva nas decisões sobre aquilo que é pesquisado nas universidades, redirecionando e ressignificando-as, além de conceder às empresas o direito de se apropriar do conhecimento nelas produzidos.

A Universidade Brasileira é ainda marcada por um rígido modelo de organização: centralizado, hierarquizado, pouco transparente e fechada à participação democrática. A autonomia administrativa deve garantir a possibilidade da universidade de estabelecer sua própria organização interna, suas formas de co-governo, suas instâncias, gestão, estatutos e regimentos.

A autonomia de gestão financeira e patrimonial, por sua vez, é fundamental para o exercício das atividades da Universidade. Nas universidades públicas ela não deve ser confundida como uma forma de transmitir à universidade a responsabilidade do seu próprio financiamento nem deve ficar refém de chantagens ou ingerências políticas. Deve estar sustentada em uma política estável de financiamento público, garantindo à instituição mobilidade na discussão democrática acerca das suas prioridades de investimento, através de instrumentos como orçamentos participativos, e na aplicação destes mesmos recursos.

Neste aspecto, é merecedora de atenção a situação das universidades estaduais. A fragilidade institucional de muitas dessas universidades, desde sua normatização e fiscalização pelos conselhos estaduais de educação até a subordinação política aos governos estaduais explica a grave crise que passam muitas dessas instituições. A vinculação orçamentária das verbas para a sua manutenção é condição fundamental para que não sejam transformadas em “feudos políticos” regionais.

Para o exercício pleno desta autonomia, a UNE deve reiterar sua posição pelo fim das fundações privadas nas universidades públicas brasileiras. Instrumentos privilegiados de captação de recursos privados, as ditas fundações de apoio ferem de maneira aberta a autonomia da Universidade, sobrepondo interesses privados a produção do conhecimento e criando um terreno fértil para práticas de corrupção e mau uso dos recursos públicos.

Nas universidades pagas, a discussão da autonomia também assume contornos preocupantes. Na ausência de uma verdadeira regulamentação do ensino privado por parte do poder público, a autonomia nestas instituições é vista como oportunidade de aprofundar ainda mais a expansão desregulada de cursos, com baixa qualidade. Acentua ainda essa situação o fato de que não raro é na mantenedora que reside de fato o controle sobre os rumos das universidades pagas, limitando ainda mais a discussão democrática e a participação de todos os setores da comunidade acadêmica e da sociedade.

- Garantia de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial das universidades;

- Pela indissociabilidade entre o ensino, a pesquisa e a extensão, socialmente referenciados;

- Pela autonomia e fortalecimento do caráter público e gratuito das Universidades Estaduais;

- Pela revogação da Lei de Inovação Tecnológica e das PPP;

- Pelo Fim das Fundações Privadas ditas “de apoio”. Controle Público Já!


Gestão Democrática e Participativa

A orientação e a forma de organizar a universidade tendem, em última instância, a refletir as estruturas e relações de poder da própria sociedade. Nascida para as elites, a universidade continua refém de um modelo avesso à participação da comunidade acadêmica e da sociedade na tomada de suas decisões. Assim, a democratização das universidades é condição fundamental para o exercício pleno de sua autonomia e a livre produção do saber.

As universidades brasileiras devem incorporar mecanismos de participação democrática na discussão sobre seus rumos. A participação dos segmentos da comunidade universitária deve ser garantida em todos os órgãos colegiados da instituição, com garantia de paridade real entre estudantes, professores e técnico-administrativos. Nessas instâncias também deve ser incorporada a participação de movimentos sociais e demais organizações da sociedade, em diálogo com as demandas populares.

Ademais, instrumentos de elaboração coletiva dos planos político-pedagógicos, plano de desenvolvimento institucional, avaliação e orçamentos participativos devem ser instituídos com a finalidade de democratizar o debate acerca do planejamento e desenvolvimento da universidade.

No plano da escolha dos dirigentes das universidades, devem ser garantidas eleições diretas, secretas e, no mínimo paritárias, em todos os níveis de direção. A homologação da escolha desses dirigentes deve ser dada no âmbito da própria instituição, não devendo ser submetida a listas tríplices para a decisão do Poder Executivo.

Na defesa da paridade dois argumentos devem ser igualmente enfrentados. O primeiro, que afirma que essa luta histórica é ilegal, desconhece a existência desse instrumento em várias instituições e a garantia de autonomia dada pela Constituição à universidade. O segundo, de que os estudantes “estão de passagem pela universidade” - não estando aptos para participarem das decisões – ignora que os estudantes não são indivíduos e sim uma identidade que permanece ao logo das gerações que, com suas demandas, pautas e reivindicações, sempre estiveram “aptos” na transformação da universidade.

Nas instituições pagas, essa realidade é ainda mais grave, uma vez que a perseguição aos militantes estudantis e sindicais, a falta de transparência com as planilhas de custo e investimento e ausência de espaços democráticos de participação e decisão são elementos que orientam uma concepção de educação pautada pelos interesses imediatos da lucratividade.

A atual estrutura antidemocrática das universidades é lastreada em um marco legal conservador construído ao longo das últimas décadas, seja na contra-reforma dos militares ou na legislação do governo FHC. Esta constatação exige uma ação dos movimentos de educação pela revogação do entulho legal autoritário e pela democratização, em última instância, da própria condução e elaboração da política nacional de educação superior.

Neste aspecto, os órgãos de deliberação e regulação do ensino superior também devem ser radicalmente democratizados. Os movimentos de educação devem ter sua participação ampliada nos Conselhos Municipais, Estaduais e Nacional de Educação, assim como no Fórum Nacional de Educação aprovado na CONAE. A realização de Conferências, em todos os níveis, é outra medida visando o envolvimento democrático da sociedade na construção um Sistema Nacional de Educação para o país.

Portanto, a universidade não pode continuar abrigando os interesses menores de uma pequena burocracia universitária que fica encastelada em uma “torre de marfim” e privilégios. Transformar essa realidade obrigará uma profunda reestruturação das universidades. Para tanto, o esforço do movimento estudantil também deve se orientar pela realização de Congressos Estatuintes Paritários, visando uma profunda democratização das estruturas das instituições.

- Pela garantia da paridade em todos os níveis de representação das instituições (colegiados, conselhos, direções);

- Eleições Diretas e Paritárias para todos os dirigentes nas Universidades e FIM da Lista Tríplice para a escolha dos mesmos;

- Pela realização de Congressos Estatuintes Paritários;

- Pela realização das Assembléias Gerais Universitárias;

- Orçamento Participativo para definir prioridades de investimentos;

- Realização de Audiências Públicas para discussão de temas importantes;

- Ampla liberdade de organização estudantil e sindical – garantia de espaço físico para as entidades estudantis;

- Criação de Conselhos Comunitários que reúnam sindicatos, movimentos, outros setores sociais e os segmentos internos das Instituições de Ensino;

- Pela alteração da legislação antidemocrática que centraliza o poder nas universidades;

Financiamento

O financiamento é questão chave para a compreensão dos dilemas da universidade brasileira. Sempre que a política educacional do país é orientada pela desresponsabilização do Estado, o financiamento da educação superior pública diminui de maneira considerável. Em contrapartida, vultosos recursos públicos são direcionados para o fomento da expansão das universidades privadas no país.

A ampliação do financiamento público para as IES públicas é essencial para o exercício das atividades universitárias. Sua ausência é sentida no sucateamento dos laboratórios, do acervo precário de nossas bibliotecas e da estrutura de nossas salas de aula. Sem um aporte conseqüente de recursos públicos, ampliando as verbas de custeio e investimento, não é possível atender a reivindicada expansão com qualidade das vagas públicas.

O financiamento da universidade pública é um dever do Estado e não deve se amparar em nenhum instrumento privatizante como cobrança de taxas, matrículas ou captação via fundações privadas “de apoio”. Estas últimas, inclusive, se apóiam na universidade e não o contrário: suas “prestações de serviços” aproveitam a estrutura e o conhecimento produzido na universidade para fins privados, causando prejuízos dos mais variados à instituição.

A constituição de mecanismos de financiamento público permanente torna a universidade menos vulnerável às ingerências externas que busquem limitar sua autonomia ou o exercício de suas atividades. Para tanto, devemos continuar perseguindo um aumento vigoroso do financiamento público para as universidades.

Tivemos importantes vitórias no último período, com o Fim da DRU (Desvinculação das Receitas da União) na Educação, que permitiu o acréscimo de R$ 9 bilhões por ano para educação, a ampliação do orçamento para as Universidades Federais, que passou de R$ 9 bilhões em 2002 para R$ 20 bilhões em 2010, e a aprovação da emenda que garante a destinação de. Contudo, isto ainda é insuficiente para promover uma grande expansão das IFES, de forma que uma de nossas tarefas centrais no próximo período é fazer a luta pela destinação de, conforme aprovado na CONAE.

- 10% do PIB para educação até 2014;

- 50% do Fundo Social do Pré-Sal para educação;

- recursos públicos apenas para educação pública;


Democratização do Acesso e Permanência

A democratização do acesso sempre foi um dos temas de maior apelo na sociedade quando falamos de educação superior. Sua importância está relacionada ao fato de que a universidade também reproduz a situação de exclusão educacional que atinge amplos setores da nossa população.

O Brasil registra um dos índices mais baixos de acesso ao ensino superior na América Latina, concentrando quase 14% dos jovens de 18 a 24 anos. Destes, 74,9% estão matriculados em instituições privadas e 24,1% nas públicas (MEC, 2008), sendo que as instituições particulares representam 90% do total.

Este cenário revela a orientação dominante das políticas educacionais do país que frente a forte demanda por ensino superior, privilegiou um modelo de expansão centrado no ensino privado, transformando a Universidade em um privilégio de quem pode pagar.

Reforçando esse quadro de exclusão, os governos neoliberais dos anos 90 e seus associados do Banco Mundial venderam durante muitos anos a falsa idéia de que o centro do problema era a Universidade Pública e seu suposto caráter elitista.

É notório que a Universidade Pública também foi afetada pelo processo de alijamento dos setores populares do ensino superior, particularmente em alguns cursos mais visados (Medicina, Direito, Engenharia, Arquitetura, etc). Contudo, para a grande maioria dos estudantes oriundos da escola pública e de baixa renda, ainda é na Universidade Pública que é encontrada a oportunidade de ingresso em um curso superior.

O que os neoliberais buscavam, no entanto, não era resolver o "problema" do acesso a educação superior, mas construir a legitimidade na sociedade para uma grande ofensiva sobre a Universidade Pública, pavimentando o caminho para a expansão do ensino privado no país. Longe de trazer a democratização do acesso, esse avanço mercantil sobre a educação brasileira acentuou ainda mais o não atendimento à grande demanda da juventude brasileira por ensino superior.

Para superar essa condição defendemos a universalização e o livre acesso à educação pública em todos os níveis. Contudo, como esse é um objetivo de longo prazo, devemos defender a imediata expansão da rede pública e a adoção de políticas de ação afirmativa que, articuladas com políticas de melhorias da educação básica, beneficiem os setores historicamente excluídos da universidade, alterando assim sua composição social e fazendo da educação superior um instrumento de combate às desigualdades.

Afinal, são poucos os que chegam à universidade. Em uma trajetória de idas e vindas, tudo começa ainda fora de seus muros. Nas universidades públicas, referência de qualidade social em relação às demais, acessam com maior facilidade aqueles que têm condições de pagar por ensino médio e cursinhos de pré-vestibular privados.

A disputa é dura. O instrumento de seleção – o vestibular – é emburrecedor; do ponto de vista pedagógico privilegia a memorização do conhecimento e não sua reflexão crítica e o contexto social na qual ele está inserido. Além disso, o vestibular se tornou um negócio lucrativo para os donos de mega-cursinhos privados e para as empresas que elaboram as provas.

Aos setores populares são apresentadas alternativas em cursinhos de pré-vestibular populares que são importantes, mas com resultados ainda modestos, dadas as dificuldades estruturais. Como se ainda não bastasse, muitos estudantes ainda não conseguem vencer toda a burocracia para ter isenção na inscrição ao vestibular.

Num cenário como esse, as políticas afirmativas são iniciativas transitórias, mas bem vindas. Os que se erguem contra a adoção de cotas ou reserva de vagas para o acesso a universidade se escoram no velho e batido argumento do mérito, da meritocracia. Para estes, a entrada de setores populares diminuiria a qualidade acadêmica da universidade. A pertinência do argumento cai por terra, no entanto, quando avaliamos o bom desempenho acadêmico dos estudantes ingressos por essas medidas.

Nossa luta deve ter como norte a universalização da educação pública e de qualidade, que só pode ser efetivamente oferecida pelas instituições que não estão submetidas à lógica do mercado. Em outras palavras, não podemos privilegiar a ampliação do acesso a universidade pelo ensino privado como resposta a grande demanda por vagas no ensino superior.

A expansão do ensino privado nunca foi acompanhada da elevação da qualidade das nossas universidades. A criação de unidades, cursos e centros universitários se orientam tão somente pelo horizonte empresarial, destinando ao mercado a escolha do lugar mais atrativo para atender novos “clientes”.

Democratizar o acesso a universidade pública é lutar para que os estudantes não continuem contabilizados enquanto números na expansão dos lucros de um dos setores empresariais que mais cresce no país.

Neste terreno, merece consideração a implementação do REUNI nas Universidades Federais. O Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI) hoje é uma realidade nas universidades federais brasileiras. Apresentado pelo MEC durante o ano de 2007, consideramos como avanço a ampliação da universidade pública, mas a ausência de diálogo com o movimento de educação na formulação do programa e a postura de várias reitorias que optaram pela truculência ou pelo esvaziamento dos debates nos conselhos merece crítica contundente do movimento estudantil.

Em linhas gerais, devemos nos apropriar imediatamente dos debates e “ocupar” as propostas em curso nas universidades federais. Queremos os recursos do REUNI e uma expansão com qualidade e assistência estudantil, mas expandir, por expandir, não é suficiente. Devemos ter clareza de que propostas que tenham como centro a flexibilização dos currículos, no sentido de permitir a diplomação intermediária (como é o caso dos bacharelados interdisciplinares), a criação de cursos aligeirados e a precarização da formação superior devem ser combatidas pelo movimento estudantil. Além disso, devemos lutar para que a qualidade da expansão, a autonomia e o repasse de recursos da Universidade não sejam condicionados por metas que desconsiderem a realidade da universidade.

O novo ENEM, pelo simples fato de explicitar à sociedade que o vestibular não é algo imutável e a necessidade urgente de se refletir sobre ele e modifica-lo, já é encarado com boa aceitação pelo conjunto dos movimentos de educação. Porém ressaltamos que este ainda não é o modelo ideal, e que precisamos criar espaços de discussão dentro da Universidade e das organizações do movimento estudantil para que assim entendamos os limites e avanços da proposta e possamos avançar em uma formulação que deve ter como horizonte o fim do vestibular.

Assistência estudantil é parte do direito a educação

Para além das grandes dificuldades de entrar na Universidade, uma parcela significativa dos estudantes brasileiros enfrenta uma dificuldade ainda maior: permanecer estudando.

As próprias políticas de ação afirmativa, quando não articuladas com políticas de assistência social ao estudante, são inviabilizadas, uma vez que não há garantias de que os setores populares possam permanecer na Universidade e tenham condições iguais de aprendizado em relação aos demais estudantes.

A existência de políticas articuladas de assistência estudantil em termos de programas de moradia, creches, transporte, alimentação, saúde, esporte e cultura devem reduzir as desigualdades socioeconômicas e culturais presentes no ambiente universitário, e também possibilitar uma formação plena ao estudante.

Assim, faz-se necessário uma concepção avançada de Assistência Estudantil, em que esta esteja articulada ao processo educativo, integrada ao tripé ensino, pesquisa e extensão e inserida na práxis universitária. Neste sentido, o estudante beneficiado não deve ser confundido com mão de obra barata nas universidades ou como instrumento de precarização do trabalho nas instituições de ensino.

Consideramos ainda que, comprovadamente, as políticas de assistência ao estudante além de combaterem a evasão e a desistência, proporcionam um melhor rendimento acadêmico aos estudantes beneficiados.

Desde 1997, quando o governo FHC suprimiu os recursos destinados à Assistência Estudantil - então considerada um "gasto" desnecessário ao funcionamento da universidade - esta tem se tornado uma importante bandeira de mobilização da UNE, impulsionando muitas lutas pelo Brasil. Assim, a manutenção, mesmo que debilitada, de alguns desses programas nas universidades se deve em grande parte a essa combativa ação do movimento estudantil. Somente em 2007 o governo federal retomou os investimentos específicos para permanência estudantil com o PNAES (Plano Nacional de Assistência Estudantil), que em 2010 investiu R$ 300 milhões nas IFES, ainda assim insuficiente para muitas instituições, devido ao aumento de vagas e sua adesão ao SiSU – Sistema de Seleção Unificada.

Nas Universidades Privadas, onde essa realidade é ainda agravada pelos aumentos abusivos das mensalidades, as políticas de permanência devem estar articuladas a um novo modelo de crédito educativo e financiadas pela taxação dos lucros das instituições e pela regulamentação da filantropia, convertida em bolsas para estudantes de baixa renda.

A destinação de recursos públicos específicos para a manutenção das políticas de assistência estudantil é condição fundamental para a construção de um perfil democrático e popular para a Universidade Brasileira. Para tanto, os investimentos disponibilizados devem ser orientados por uma concepção universalizante de política pública que afaste qualquer viés assistencialista na sua implementação.

Outro pressuposto fundamental é que tanto a aplicação das verbas destinadas a assistência estudantil quanto sua fiscalização sejam acompanhadas pelo movimento estudantil em conselhos democráticos dentro da instituição.

Ademais, é preciso fortalecer institucionalmente as ações e políticas de permanência, com a criação de órgãos específicos como Pró-Reitorias de Assistência Estudantil, responsáveis pela execução de Planos de Assistência Estudantil debatidos amplamente com os estudantes em cada universidade.

- “Ocupar o REUNI”, disputando programas de expansão que garantam assistência estudantil e garantia da qualidade de ensino: laboratórios, bibliotecas, salas de aulas, professores qualificados; Contra as modalidades de formação intermediária;

- Forte ampliação do ensino superior público presencial na próxima década, com interiorização e criação de novas IFES, a partir de projetos democraticamente discutidos com a comunidade, com vistas a alcançar 60% das matrículas no ensino superior nas IFES;

- Pelo fim do vestibular e adoção de modelos não-excludentes de acesso ao ensino superior;

- Pela ampliação das verbas para Assistência Estudantil com rubrica própria da União, que garanta o investimento em moradias estudantis; criação, recuperação e ampliação dos restaurantes universitários; criação de creches nas universidades, transporte público gratuito (passe livre), bolsas permanência, atendimento à saúde, etc;

- Criação da Secretaria de Assistência Estudantil no MEC;

- Financiamento da assistência estudantil nas Universidades pagas através de taxação dos lucros do ensino privado e/ou através de outros meios que não da União. Verba pública somente para educação pública;

- Pela aprovação do Projeto de Lei de Reserva de Vagas nas universidades federais;


Regulamentação do Ensino Privado

Compreender a educação superior no país passa, necessariamente, por discutir a profunda mercantilização a qual a mesma está submetida. A hegemonia do privado sobre o público na Universidade Brasileira se manifesta em diversos aspectos. Na abertura indiscriminada dos cursos, na apropriação comercial do conhecimento produzido, nos métodos pedagógicos alienantes, na proliferação de taxas e cursos pagos, na cobrança abusiva de mensalidades e em tantos outros momentos em que o caráter público do direito à educação passa ao largo de nossa realidade.

A mercantilização da educação atinge níveis de extrema gravidade. Os rumos da educação brasileira estão sendo cada vez mais definidos nas bolsas de valores e no comércio de serviços internacional. A relevância social e o compromisso com o desenvolvimento do país têm dado lugar ao conhecido vocabulário do mercado financeiro. Com o reconhecimento da OMC (Organização Mundial do Comércio) da Educação Superior como área passível de investimentos, hoje o setor educacional privado seja o sexto setor da economia nacional.

Isto faz com que cada vez mais as instituições passem a operar como empresas, submetendo-se a lógica do mercado e orientando-se pelo lucro. O que leva a abertura e fechamento de cursos conforme as leis da oferta e da procura, a demissão sistemática de quadro docente qualificado, por conta de seus maiores salários e a proibição da rematrícula dos estudantes inadimplentes.

Entre fusões e ações colocadas no mercado, a educação superior tem ficado refém de uma notável desnacionalização, conforme atestam as recorrentes aquisições de instituições brasileiras por grandes corporações internacionais. Num cenário como esse não há margem para duvidas: a restrição total a entrada do capital estrangeiro na educação superior do país é uma luta prioritária da UNE e do movimento estudantil.

Em outras palavras, a educação superior privada é um “negócio” que tem dado dinheiro no Brasil. Apoiada na influência do setor privado nos órgãos reguladores do executivo e no poder legislativo, sua ampliação tem sido conduzida sem compromisso com a qualidade social e a garantia do tripé ensino, pesquisa e extensão. A própria estrutura de muitas instituições – que não raro se aproximam com um colégio ampliado de terceiro grau ou shopping center - reflete a massificação do acesso em curso.

Outra questão diz respeito à fragmentação dos cursos e das instituições que faz com que proliferem cursos tecnólogos, à distancia, on-line e afins sem nenhum tipo de critério acadêmico, Ademais as altas mensalidades impostas aos estudantes, a punição aos inadimplentes e a falta de transparência com as planilhas, assim como a ausência de democracia interna, de liberdade de organização das categorias, descumprimento de direitos trabalhistas e ausência de programas de assistência estudantil atualizam a luta pela regulamentação desta modalidade de ensino, medida esta que o MEC não foi capaz de empreender.

A falta de regulamentação e controle público sobre o ensino privado permitiu uma liberalização do sistema, de forma a que cada vez mais a educação distancia-se de suas prerrogativas constitucionais de ser um direito constitucional para tornar-se, efetivamente, um produto à venda.

Visando sanar a contradição entre o baixo poder aquisitivo da população e as altas matrículas e mensalidades no Ensino Superior pago, diversas formas de crédito educativo já foram utilizadas pelos governos, como o Crédito Educativo (Creduc), substituído pelo FIES (Financiamento Estudantil) em 1999, ambos programas que logo após a formatura do estudante, passavam a cobrar o valor do financiamento, acrescido de juros compostos altíssimos, como se o diploma de curso superior fosse garantia de emprego logo após seu término. Graças aos altos juros, os índices de inadimplência no programa encontram-se em torno de 30%, com mais de 50 mil devedores. Em 2010 o governo lançou o Novo FIES, reduzindo os juros e ampliando os prazos para quitar a dívida.

Ao fim do governo FHC tínhamos clareza de que o problema fundamental do acesso ao Ensino Superior no Brasil, já não era tanto a quantidade de vagas disponíveis, mas sim a natureza destas vagas e as condições para acessá-las, pois no ensino pago já existia uma oferta de vagas superior ao número de formandos no Ensino Médio anualmente, gerando assim altos índices de evasão, inadimplência e vagas ociosas. Neste cenário, o Ensino Superior pago no Brasil chegara ao seu esgotamento, encontrando-se em uma forte crise.

No entanto, a resposta inicial do governo Lula para esta questão foi a criação do Programa Universidade Para Todos (PROUNI), que consiste em um programa de isenção fiscal para instituições pagas, com ou sem fins lucrativos, em troca de bolsas de estudo.

Desde sua criação o PROUNI já beneficiou mais de 700 mil estudantes, e ao ser um passo importante na implementação de políticas de ações afirmativas, tem contribuído para a alteração do perfil do Ensino Superior brasileiro. Porém, não obstante a face progressista que o PROUNI possui, ao possibilitar o acesso à universidade de setores dela historicamente excluídos – por mais duvidosa que possa ser a qualidade do ensino ofertada –, é inegável que o programa representou um fortalecimento do ensino privado. Além disso, ao eleger como parceiros os “tubarões do ensino”, o governo contribuiu para aumentar o poder relativo deste setor e tornar ainda mais difícil aprovar medidas efetivas de regulamentação e controle das instituições privadas de Ensino Superior. Na prática, o PROUNI foi a salvação de muitas instituições que estavam à beira da falência.

No que diz respeito ao movimento estudantil, nossa tarefa é a organização dos estudantes beneficiados pelo programa, tendo em vista a luta por melhores condições de ensino, a necessidade de uma regulamentação única do programa para todas as IES, com a normatização dos processos de seleção e renovação das bolsas; a necessidade de maior clareza nas informações aos bolsistas e candidatos; distribuição uniforme das vagas nos cursos e flexibilização para a transferência nestes; ampliação do percentual de bolsas de 8,5% para 20% por IES; redução do percentual de aprovação (que é de 75%); aumento do prazo para que o aluno conclua a graduação, permitindo-o estudar e trabalhar ao mesmo tempo; no que diz respeito à assistência estudantil, pautar a vinculação do valor da bolsa-permanência ao salário-mínimo nacional e ampliação do número de bolsas a todos que necessitem; auxílio xérox, material didático, moradia estudantil e alimentação subsidiada; meio-passe intermunicipal; descontos em cursos de informática e línguas oferecidos nas IES; adoção de políticas de incentivo à pós-graduação, estágios e entrada no mercado de trabalho; e combate ao preconceito e discriminação aos estudantes prounistas, com o mesmo tratamento dos demais estudantes.

Além disto, defendemos que o PROUNI seja utilizado pelo Ministério da Educação como um instrumento mais efetivo para a regulamentação e democratização das Universidades pagas, obrigando-as a realizar eleições diretas e paritárias para a escolha de seus reitores e diretores de unidades, participação discente em conselhos e colegiados, controle público sobre o aumento de mensalidades e a garantir a liberdade de organização estudantil e sindical na instituição. Caso não aceitem, serão desvinculadas do programa. É inaceitável que estas instituições pagas sigam possuindo isenção fiscal de seus impostos sendo antidemocráticas.

Mudar essa realidade exigirá muita mobilização por parte do movimento estudantil. Outro esforço deve caminhar no sentido de ampliar a compreensão do ME sobre o funcionamento do ensino privado, cada vez mais complexo e lastreado em diversas instituições (com fins lucrativos, (p)filantrópicas, confessionais, comunitárias, etc).

Retomar experiências exitosas como a campanha contra a mercantilização da educação deve incidir duramente na luta pela regulamentação do ensino privado e contra a omissão criminosa dos sucessivos governos com a hegemonia do ensino privado no país.

- Pela garantia da qualidade do ensino, pesquisa e extensão, com laboratórios, salas de aula, bibliotecas, professores qualificados e assistência estudantil (restaurante universitário barato, bolsas e moradia estudantil);

- Não à inclusão da educação como serviço nos acordos da Organização Mundial do Comércio;

- Pela restrição à financeirização e entrada de capital estrangeiro na educação;

- Regulamentação do ensino privado e pela redução das mensalidades – aprovação do Projeto de Lei de Mensalidades da UNE;

- Pelo direito de matrícula dos inadimplentes;

- Publicidade dos livros-caixa e das planilhas de custos das IES;

- Controle Social das vagas destinadas ao PROUNI, com garantia de qualidade, assistência estudantil, ampliação de direitos aos bolsistas e gestão democrática das IES ligadas ao programa; pelo fim do PROUNI nas instituições privadas;

- Não ao ensino à distância como meio de mercantilização do ensino e único meio de formação;

- Pelo fim dos cursos pagos e seqüenciais na universidade pública;


Extensão Universitária

A base de sustentação das Instituições de Ensino Superior está alicerçada no princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão previsto por nossa Constituição. Sem esse tripé, não há formação completa do processo educativo.

A extensão universitária no Brasil teve início na metade do século XX, quando foi imposta a necessidade de difundir os pacotes tecnológicos importados através do desenvolvimento e expansão da indústria pós-segunda guerra mundial. Neste contexto, a chamada "revolução verde" viu na extensão rural, que foi a primeira experiência extensionista no país, um meio de "estender" às comunidades rurais a tecnologia em questão.

As universidades, institutos e órgão técnicos públicos foram os aparatos onde tais ações foram aplicadas através de um forte investimento público. Sendo assim, a extensão universitária consolidou-se como um processo de intervenção em uma determinada realidade e situação, onde era aplicada uma "formula mágica do saber científico" sem levar em conta o contexto sócio-político-cultural, alterando completamente a realidade em questão e tornando-a dependente dessas tecnologias ali incorporadas.

Contudo, mesmo que majoritariamente as premissas tenham sido mantidas em relação à concepção de extensão, desenvolveram-se ao longo do tempo outras linhas teóricas que defendem um processo de "comunicação" (muito difundido por Paulo Freire) entre Universidade – Sociedade. Ou seja, a produção do conhecimento a partir da cultura local, do saber popular e das condições do meio, sempre buscando garantir a autonomia em relação às tecnologias implementadas, inclusive valorizando as tecnologias alternativas oriundas do empirismo.

A presença de distintas concepções de extensão universitária está intimamente ligada à disputa de concepção da própria universidade. Para a construção de uma Universidade Democrática e Popular é necessário que a UNE estimule a realização de projetos de extensão que não tenham como proposta político-pedagógica a imposição assistencialista do "saber universitário" na comunidade, mas sim, a troca e construção entre o saber popular e o saber científico de alternativas que possam melhorar a vida de um povo sem torná-los dependentes, mas sim libertá-los cada vez mais.

Uma extensão popular que esteja engajada na transformação da sociedade e permita aos estudantes participarem de experiências que questionem o atual modelo de Universidade.

No entanto, a extensão universitária geralmente é relegada a um segundo plano nas instituições, com poucos recursos e poucos projetos, reduzindo o número de estudantes interessados consequentemente. A UNE deve pautar que no governo Dilma a extensão seja priorizada e receba um aporte considerável de recursos, passando a fazer parte dos currículos nos cursos de graduação, de forma integrada ao ensino e à pesquisa.

A experiência dos EFIEspaços de Formação Integral devem ser analisados pelo movimento estudantil para, a partir da realidade brasileira construir um modelo de educação integral que unifique ensino-pesquisa-extensão sob uma perspectiva multidisciplinar vinculada à sociedade.

Há no Movimento Estudantil experiências de projetos de extensão, como Estágios Interdisciplinares de Vivência (EIV) e Assessorias Jurídicas Populares, que possibilitam a construção de uma concepção emancipadora de extensão nas universidades e que tem como premissa a articulação com os Movimentos Sociais. Estas iniciativas devem ser incorporadas nos currículos dos cursos e incentivadas com um conseqüente investimento público.

- Pela ampliação radical dos recursos para Extensão Universitária;

- Pela ampliação das Bolsas PIBID, PIBEX, Conexão de Saberes, etc. e apoio às experiências de Extensão Popular nas universidades;

- Pela curricularização das atividades de Extensão, compondo as grades curriculares de todas as disciplinas, sob a perspectiva da formação integral;

- Pela construção e fortalecimento dos projetos e atividades de Extensão Popular, juntamente com os Movimentos Sociais;

- Pela construção de um Seminário Nacional de Extensão pela UNE;


Pesquisa

A universidade, enquanto espaço de produção e difusão da produção de novos conhecimentos, tem na Pesquisa uma de suas características diferenciadoras em relação às demais instituições educacionais. Sua importância está intimamente ligada ao fato de que um elevado desenvolvimento científico é condição necessária para o pleno desenvolvimento do país.

A velha crença de uma ciência neutra, ensimesmada nos seus próprios pilares, não encontra espaço nas lutas do movimento estudantil. A construção de uma Universidade Democrático e Popular exige uma pesquisa engajada na solução dos grandes problemas nacionais.

No Brasil, apesar das tentativas de desmonte, a universidade pública concentra mais de 90% da produção científica nacional. Esses números, contudo, escondem a difícil realidade da pesquisa nas universidades. Como se não bastasse o sucateamento dos instrumentos, laboratórios e as insuficientes bolsas de pesquisa, encontramos ainda na universidade um processo de mercantilização da produção científica de grandes proporções.

A ação das fundações privadas, por exemplo, acentua tal processo de apropriação privada do conhecimento da universidade pública, sobrepondo interesses empresariais e direcionando a orientação das pesquisas realizadas. Assim, a necessária ampliação do investimento público para a pesquisa deve estar associada ao fim das fundações privadas de apoio e a mecanismos transparentes de investimento no setor.

Também faz-se necessário pautar a alteração das concepções “produtivistas” que norteiam as agências reguladoras e órgãos de fomento, como o CAPES e CNPq, priorizando a quantidade em detrimento da qualidade ou relevância social de diversos projetos.

- Pesquisa para o povo e não para as empresas!

- Ampliação dos investimentos públicos em pesquisa em todas as áreas do saber;

- Ampliação das bolsas PET e de iniciação científica nas Universidades;

- Pelo Fim das Fundações Privadas ditas “de apoio”;

- Fim dos critérios estritamente produtivistas para pesquisa científica;


Avaliação Institucional - Por uma Avaliação de Verdade

No final da década de 80, iniciou-se no movimento de educação o debate sobre a construção de uma proposta de avaliação para as Instituições de Ensino Superior. Uma das grandes propostas formuladas foi o PAIUB (Programa de Avaliação das Instituições Universitárias brasileiras). Essa experiência concretizou-se a partir de em um método de avaliação que levava em consideração as peculiaridades de cada em instituição. Ainda , era composto a partir de uma avaliação interna e externa, as quais visavam identificar os pontos fortes e fracos com intuito de fortalecer o que havia de positivo e melhorar os pontos fracos.

Além disso, a avaliação não era entendida como obrigatória e nem punitiva. A Universidade optava em fazer ou não avaliação, e ao optar em realizar, tinha autonomia para, de acordo com modelo geral, criar um mecanismo avaliativo que melhor se adequasse a realidade da Instituição.

Essa proposta avaliativa das Universidades teve pouco tempo de duração. Permaneceu em vigor durante o mandato do Presidente Itamar Franco. Já em 1994, quando FHC assumiu a presidência um dos seus primeiros atos foi extinguir o PAIUB que ainda estava em processo de consolidação nas Instituições de Ensino Superior.

O Governo FHC criou o PROVÃO. Essa experiência considerava como objeto avaliativo apenas os cursos de graduação e, em especial, os estudantes. Ou seja, era uma avaliação parcial. Junto a isso, foi usado como uma ferramenta para implementar um conjunto de mudanças conservadoras na educação Superior baseada na desresponsabilização do Estado com o financiamento da educação pública e na valorização do ensino privado.

Essa avaliação era punitiva e ranqueadora, pois transferia a responsabilidade do desempenho da Instituição apenas para os estudantes e, ainda, punia os cursos que tiravam notas baixas ao invés de estabelecer mecanismos de solução dos problemas a partir do investimento público. O fato que o Provão estava a serviço de uma política que visava mercantilizar a educação através da premiação dos melhores “avaliados”, valorização da meritocracia e fomento do setor privado na educação.

Em resposta, o Movimento Estudantil construiu uma forte campanha pelo boicote ao Provão. Esse boicote criou as condições para que, posteriormente, fosse criado um novo sistema de avaliação – o SINAES (Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior).

O SINAES representou um avanço em relação ao método de avaliação anterior. No entanto, sua implementação através de uma medida provisória careceu de um maior debate com o movimento de educação e sua orientação ainda carrega alguns problemas do modelo anterior. Ele é constituído de uma avaliação externa e interna das IES. Contudo, ao mesmo tempo em que avançou, incorporou parte da lógica do Provão expressa no atual ENADE (Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes), mantendo um peso muito grande sobre a avaliação dos estudantes.

O SINAES absorveu parte das reivindicações do movimento de educação como a elaboração de uma avaliação onde seja avaliada toda a instituição e os segmentos que a compõem como técnicos, docentes e discentes (como avaliação interna), além de submeter à instituição uma avaliação externa, que seria feita pelos setores organizados da sociedade.

Contudo, o ENADE mantém a lógica ranqueadora e punitiva. Sendo assim, seus problemas ainda são muitos: o fato de ser um componente curricular obrigatório sem ter nenhuma discussão com as entidades que representam os cursos de graduação; manter a doação de bolsas como estimulo para os estudantes que obtiverem as melhores notas (meritocracia); uma mesma prova para os estudantes do início e do final do curso que realizam o exame; mantém-se um peso muito grande (60%) sobre avaliação dos estudantes na definição do IGC – Índice Geral de Cursos, ranking de qualidade entre universidades públicas e privadas, cujas notas são publicizadas pelo MEC, possibilitando o ranqueamento e a utilização do resultado pela as IES privadas e pela mídia para fazer marketing e se utilizarem disso para fins comerciais.

Além dos problemas do ENADE, o conjunto do sistema precisa avançar. A Comissão Nacional de Avaliação precisa ser mais representativa do ponto de vista do movimento social, a qual, hoje é composta pela maioria de representantes do governo. Nas universidades, o Movimento Estudantil, através de suas entidades, precisa estar atento a esse importante debate. É fundamental que ocupemos e democratizemos os espaços, conselhos e comissões – como as CPA’s, Comissões Próprias de AutoAvaliação – que tratam da avaliação institucional, já que esta participação influi para definição dos rumos das instituições de ensino.

Os problemas dos sistemas de avaliação devem ser duramente combatidos pelo Movimento Estudantil e nesse sentido acreditamos uma opção correta daqueles que, mesmo acreditando que é possível avançar na proposição de políticas na esfera do governo, organizam o Boicote ao ENADE com o objetivo de questionar essa forma de avaliação centrada basicamente nos estudantes.

- Pelo Boicote ao ENADE;

- Avaliação com caráter diagnóstico e não ranqueador

- Pela ampliação da participação estudantil nas CPA e CNA e democratização destas;

- Pela organização de Fóruns de Avaliação Institucional nas universidades com vistas a construção de uma proposta alternativa de avaliação dos estudantes, cursos e instituições;

- Pela construção de um Seminário Nacional de Avaliação Institucional pela UNE.

Texto- Pré tese reconquistar a UNE- Edição Pedro Sérgio da Silveira 1° Diretor de Movimentos Sociais da UNE